2 de Janeiro
Dia diabólico. Entre as memórias recentes e arrefecidas de uma noite alegre, uma noite de amizade, uma noite balanços e projectos, ergue-se um suave torpor, um suave incómodo, onde paira ainda um sabor agridoce de tudo o que nas últimas horas se pensou e se viveu. Subitamente a realidade assume proporções assustadoras. O sonho, o objectivo traçado já não é, nem de perto, nem de longe, tão verosímil como tudo o que naquelas horas de boa disposição, entre risos, sorrisos, taças de champanhe e uvas passas, parecia tão concreto, tão realizável como qualquer movimento banal.
Como se um pesado e empoeirado manto se abatesse, abafando os sons e os sentidos. Ao nariz acodem lenços de papel ás dezenas; o sabor perdido nas memórias de sabor indescritível por serem ora demasiado confusas na mistura de aromas, ora demasiado extremas para que as palavras as sustentem na sua verdadeira essência (boa ou má); aos olhos e aos ouvidos surge uma falta de vontade, uma desmotivação de partir para o que vemos defronte e um cansaço de ouvir o que sempre ouvimos e o que, daqui parece sempre ouviremos; ao tacto falta algo concreto para se sentir, tudo por onde vagueio é demasiado longe para chegar com as mãos, tudo por onde vagueio é demasiado longe para ser sentido verdadeiramente.
Já se lançam ás chamas tantas dúvidas e tantas questões que em 2003 perturbaram as nossas mentes. Poderão elas renascer das cinzas como uma fénix? A qualquer momento. Neste dia, em particular, há a propensão para permitir que isso aconteça com maior facilidade. É, talvez, quando estamos mais frágeis e ainda mais perto do local onde deixamos para trás o odor a memórias queimadas. Talvez seja uma tolice deixar que isso aconteça assim, num só dia, num momento total de ausência das nossas forças emocionais, num instante onde tudo nos abandona em silêncio. Mas talvez não tenhamos a força suficiente para controlar o poder dessa “tolice”. Talvez as nossas defesas estejam programadas para nos defender dos outros e não o suficiente de nós próprios.
O dia 2 de Janeiro deve servir para perceber o perigo que somos para nós próprios, a todo o momento. Para entender que por maior que seja o nosso contentamento à meia noite do dia 1, tudo será normal, banal, comum a tudo no dia 2. E só aí começa verdadeiramente o ano. Quando temos a percepção de que estamos de volta... ao sítio de onde, na verdade, nunca saímos...
JV
Dia diabólico. Entre as memórias recentes e arrefecidas de uma noite alegre, uma noite de amizade, uma noite balanços e projectos, ergue-se um suave torpor, um suave incómodo, onde paira ainda um sabor agridoce de tudo o que nas últimas horas se pensou e se viveu. Subitamente a realidade assume proporções assustadoras. O sonho, o objectivo traçado já não é, nem de perto, nem de longe, tão verosímil como tudo o que naquelas horas de boa disposição, entre risos, sorrisos, taças de champanhe e uvas passas, parecia tão concreto, tão realizável como qualquer movimento banal.
Como se um pesado e empoeirado manto se abatesse, abafando os sons e os sentidos. Ao nariz acodem lenços de papel ás dezenas; o sabor perdido nas memórias de sabor indescritível por serem ora demasiado confusas na mistura de aromas, ora demasiado extremas para que as palavras as sustentem na sua verdadeira essência (boa ou má); aos olhos e aos ouvidos surge uma falta de vontade, uma desmotivação de partir para o que vemos defronte e um cansaço de ouvir o que sempre ouvimos e o que, daqui parece sempre ouviremos; ao tacto falta algo concreto para se sentir, tudo por onde vagueio é demasiado longe para chegar com as mãos, tudo por onde vagueio é demasiado longe para ser sentido verdadeiramente.
Já se lançam ás chamas tantas dúvidas e tantas questões que em 2003 perturbaram as nossas mentes. Poderão elas renascer das cinzas como uma fénix? A qualquer momento. Neste dia, em particular, há a propensão para permitir que isso aconteça com maior facilidade. É, talvez, quando estamos mais frágeis e ainda mais perto do local onde deixamos para trás o odor a memórias queimadas. Talvez seja uma tolice deixar que isso aconteça assim, num só dia, num momento total de ausência das nossas forças emocionais, num instante onde tudo nos abandona em silêncio. Mas talvez não tenhamos a força suficiente para controlar o poder dessa “tolice”. Talvez as nossas defesas estejam programadas para nos defender dos outros e não o suficiente de nós próprios.
O dia 2 de Janeiro deve servir para perceber o perigo que somos para nós próprios, a todo o momento. Para entender que por maior que seja o nosso contentamento à meia noite do dia 1, tudo será normal, banal, comum a tudo no dia 2. E só aí começa verdadeiramente o ano. Quando temos a percepção de que estamos de volta... ao sítio de onde, na verdade, nunca saímos...
JV
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